A VISITA DA MORTE

...Ela é safada, às vezes só aparece para sacanear...


Pálida, rosto escaveirado e vestida numa túnica negra, a esposa do senhor Fred, ao atender à porta, informou que a pessoa que ela procurava, o esposo, encontrava−se no banho. Abriu a porta, acompanhada da filha, uma garota de três anos de idade, que, enfezada, não tirava os olhos da esquisita visitante. De repente, a menina disse que ela era desalmada. De modo cínico, a esquisita figura, refutou:
– Não se espante, senhora, costumo causar tais inspirações até mesmo nos pequeninos.
A garota havia corrido. Chorosa, dum canto gritou:
– É a morte, mamãe! Veio buscar o papai.
Não houve tempo para a jovem senhora assimilar o aviso, pois o esposo se fez presente e ela se retirou. A feia figura, ao mostrar a credencial a Fred, se empalideceu completamente...
– Vamos entrar... Vamos entrar.
– Tenho mais o que fazer, senhor.
– Entre. Eu lhe peço. – suplicou.
Adentraram e acomodaram−se em uma sala... O senhor Fred disse−lhe que tinha apenas vinte e oito anos de idade. Vivia uma fase de bons ventos. Entretanto, tivera infância e juventude sacrificadas. Portanto, não seria justo ser arrebatado de modo torpe. A feia figura, por sua vez, replicou que havia uma verdade profunda ocultada. Segundo ela, o mundo também existia para os que jamais existiram, para os que não mais existiam e para os que jamais existiriam.
– Diz que, espiritualmente, continuarei a viver? – perguntou.
– ...
Com a falta de resposta, Fred disse−lhe que não havia pedido para nascer, entretanto, aceitou a vida de bom grado. A entidade que ela representava deveria ter consideração e respeito para com os honrados viventes. Deveria ser sensata, e não sair perdida arrebatando irresponsavelmente. Tinha conhecimento do número de vermes polidos e brutos que respiravam? Inúmeros! Aqueles sim que deveria dar cabo. Pois seria um alívio para o mundo...
– Você conheceu a minha esposa e filha... ficariam desamparados...
A feia figura, ouvindo o apelo, foi até grandiosa. Disse que não procederia da mesma forma que os vaidosos estúpidos, e dizer que seria problema deles. Porém estava cumprindo sua missão.
– Por favor! 
 suplicou Fred começando a chorar.
– Querendo benzer−se, concedo−lhe a graça, senhor.
– Por favor, eu amo a minha esposa e a minha filha. Os meus pais dependem de mim.
– Sou ‘Oficial da Vida’ senhor! Está pronto?
– Oficial da Vida... Você é oficial da maldade, da injustiça, da insensibilidade e da dor.
– Vamos logo, senhor, benza−se, porque tenho mais o que fazer.
Soluçando e enxugando as lágrimas, pediu−lhe um minuto e, ao sair, a feia figura, o advertiu:
– Senhor, não consentimos despedida!
Em vão.
– Que sujeito recalcitrante! – murmurou ela.
Fred retornou com um maço de papéis, o qual colocou sobre a mesa, e disse que aquilo era um trabalho científico que estava desenvolvendo. Concluído e posto em prática, iria beneficiar a vida de milhares de pessoas. Portanto, não seria justo partir.
– Outro dará prosseguimento, senhor.
Com a indiferença explícita, Fred sentou−se e voltou a chorar. Socava as coxas e, inconformado, dizia:
– É uma verdadeira sacanagem. Não pode fazer isso comigo. Esse trabalho precisa ser concluído. Tenho esposa, filha e meus pais que dependem de mim.
A feia figura, por sua vez, cujo propósito naquela missão era apenas o de assustar, ficou o olhando:
– Que sujeito chorão!
A esposa de Fred, ao escutar a porta da rua bater violentamente, tratou de verificar o que havia acontecido. Ao entrar na sala, onde eles conversaram, encontrou o esposo caído no chão. Na residência, em frente, morava um médico. Aflita, chegou à janela. Coincidentemente o doutor Elton ia passando. Acenou para ele. Examinando−o, perguntou se houvera alguma contrariedade.
– Não que eu saiba. Recebera a visita de uma figura esquisita, pálida, rosto escaveirado, enfiada numa túnica negra. – explicou ela.
O experiente médico sorriu.
– ... Danosa emoção, senhora. Súbita queda de pressão...
A esposa nada entendeu. O assustado homem, tão logo foi reanimado, recebeu o beijo contente e carinhoso da filha.


ILUSÃO OU FATO?

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